terça-feira, 30 de março de 2010

A SOMBRINHA VERMELHA


Na manhã de hoje, andando para o meu trabalho no mesmo horário de sempre, fui apreciando a velha paisagem onde até de olhos fechados não me falta nem um detalhe e nesse emaranhado de pensamentos soltos no ar, me veio à lembrança o meu aniversário de 6 anos.

Como qualquer criança eu estava ansiosíssima pelo dia, mas sabe-se lá por que, aquele ano foi diferente. Mamãe não distribuiu convites para meus amiguinhos, nem mesmo eu ouvia falar em presentes; Primogênita de uma família inteira... mimada que só vendo, a minha cabecinha só conseguia pensar no tal aniversário que viria dentro de alguns dias, afinal eu já era uma “mocinha”, que ia fazer 6 anos.

Acordei naquele domingo de 11 de maio, e era dia das mães... meu aniversário se confundia em meio à comemoração paralela.
Continuava ansiosa, nem nos meus maiores pesadelos infantis poderia imaginar um aniversário sem festa e sem presentes.

Minha madrinha, morava conosco...jovem, pouco mais de 18 anos, mas eu a respeitava como gente grande, e como tal, era minha dinda querida e me dava presente de aniversário.
Como qualquer jovem, ela havia chegado da balada de manhã, mas já era de tarde, e eu não aguentava mais esperar tanto tempo... não me contive e fui lá, pulei em cima dela na cama, lembro como se fosse ontem, ela com um pijama amarelo berrante, com textura de toalha de banho. Ela me abraçou, me encheu de beijos e pegou um embrulho do ladinho da cama dela.
Mal continha minha ansiedade em saber o que era, afinal era um presente comprido, parecia que estava dentro de uma lata de batata frita, só que maior. Fui logo rasgando o papel, tão cuidadosamente empacotado... Era uma sombrinha vermelha... isso mesmo! Mas no auge dos meus 6 anos, a única coisa que pensava é: PORQUE RAIOS EU QUERO UMA SOMBRINHA VERMELHA???

Naquele momento eu peguei o presente que tanto esperara para abrir e olhei pra ela e minhas lágrimas não se contiveram... chorava como se tivesse sido ofendida por ter ganho uma simples sombrinha. Aquilo doía em mim, quando pensava na frustração de quem estava esperando um brinquedo com cheiro de plástico novo...puxa... uma sombrinha...

Adormeci naquela tarde, ainda aflita com todo esse “problema infantil” que havia passado, e quando acordei lá estava uma linda festa de aniversário surpresa... com todos os detalhes, do jeitinho que eu gostava e com todos os meus amiguinhos me esperando.

Com toda aquela festa... esqueci do caso da sombrinha e fui comemorar, afinal, não existe chateação de criança que não se cure com um bom brigadeiro não é mesmo?
Sei que minha madrinha ficou chateada comigo... tanto que no ano seguinte me deu um vídeo game, que com certeza deve ter custado vários e vários meses do pequeno salário que ela ganhava no supermercado onde trabalhava. Puxa, que criança mimada eu fui.

Passaram-se mais de vinte anos e hoje, estava andando rumo ao trabalho, e de repente, num desses caprichos meteorológicos do estado de São Paulo, começou a garoar. Umedeceu meu uniforme impecável e desmanchou o gel do meu cabelo; Fechei os olhos, dei um sorriso e em pensamento agradeci à minha dinda querida...Pois naquele momento, em especial naquele momento, eu pensei, que se por um instante pudesse voltar atrás, o quanto eu queria àquela sombrinha vermelha...
(Crônica escrita em 2007)

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